quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

A R T I G O S
O Ouro dos Negros

Quando você estudou a Abolição da Escravatura no Brasil, no seu romântico tempo de ginásio, deve ter imaginado que, assinada a Lei Áurea, no mesmo instante, assim como num passe de mágica, os escravos deixaram de existir. Não deixaram. Existem ainda hoje, só que, em número infinitamente maior. Claro que não são mais chamados de escravos e nem são todos negros. Hoje são chamados de assalariados, e são negros, são brancos, são amarelos, são vermelhos... Vermelhos de vergonha!
Outra diferença do escravo atual para o escravo de então é que, até 1888, ele ganhava casa, comida, assistência médica, roupa etc.. Hoje...bem, você sabe!
No dia 13 de maio de 1888, assim que “recebeu a liberdade”, o negro perguntou:
- Mas, e onde vou morar?
- Problema seu! – Respondeu o branco. – Você não queria liberdade? Pois está livre, até para escolher a cama que quiser, desde que seja sua!
- E comida?
- Problema seu!
- E saúde, educação dos meus filhos, transporte, roupa...
- Problema seu! Mas eu vou te dar uns 400 reais de salário por mês pra comprar tudo isso!
E lá foi o ex-escravo pro supermercado, pra farmácia, pro médico, pro dentista, pra livraria, pra escola, pra pegar ônibus ($2,00 de manhã, $2 de meio dia, $2 de tarde e $2 de noite), pra ir ao estádio, ao cinema, ao teatro, pra comprar jornal, pra fazer churrasco com os amigos uma vez por mês, pra comprar presente de aniversário (pros filhos, esposa, sogra, afilhado, nora, neto, comadre...) pra pagar aluguel (ou você acha que pobre tem casa própria?), pra pagar água, luz, impostos (não coloquei telefone de propósito! Porque pobre tem celular!!!)
Você dirá, assim com uma pontinha de desdém:
– Tudo bem. Não dá para fazer nada disso com o salário que eles ganham. Mas, ao menos, não tem mais chicote, nem corrente, nem tronco!
Errado de novo. Tem, sim. Porque se você faltar ao emprego, cortam seu salário. Se chegar atrasado, dão falta. Se não pagar suas contas, vai pra cadeia...
Isso não acontece só no Brasil. Lá fora, onde a abolição foi declarada cem anos antes da nossa, lá naquele país que assinou a Declaração dos Direitos Humanos, naquele país que tem na cruz seu signo maior, naquele país que até elegeu um negro presidente, ainda hoje a nação é dividida em duas raças, dois povos. Lá, como aqui, a cultura, a religião, os costumes, os hábitos, as crenças, as crendices e as tradições foram enterrados com os corpos que eram mutilados e desrespeitados.
Aqui, havia seis milhões de índios da época do descobrimento. Hoje, não passam de 280 mil. Foram chacinados aos milhares em nome de uma cultura nova e estranha. Em nome de Deus, os donos da terra foram obrigados a trabalhar como escravos para os invasores. Os brancos comiam o pão produzido com o sangue dos verdadeiros donos dessa terra!
E os negros? Também regaram a terra com seu suor para produzir alimento. O sangue vermelho correu de seus lombos negros e se misturou à farinha branca para fazer o pão que enchia a barriga daqueles que os matavam de fome e vergavam suas costas na ponta da chibata. As lágrimas dos negros, que não tinham outra alternativa senão chorar e trabalhar, construíram o conforto daqueles que se chamavam de cristãos! Suas mãos calejadas, seus dedos cortados, seus pés rachados e suas almas dilaceradas pela dor e pela humilhação construíram o país de que nos orgulhamos hoje! Até a nação mais poderosa e racista da Terra precisou dos negros para construir sua riqueza e ainda hoje depende deles para conquistar suas medalhas olímpicas. Os negros continuam a orgulhar o país que os rejeitou no passado!
(Valdelírio Michel)

2 comentários:

Carla Michel disse...

Ótimo artigo.
Parabéns...

jackes disse...

Gostei, parabéns pelo artigo sisplesmente a mais pura verdade.